14 agosto 2005

Gondomar à Bomba

visão - Investigação Gondomar à bomba

A Repsol instalou um posto de gasolina no concelho de Valentim, nos anos noventa. E deu 20 mil contos ao Sport Clube Rio Tinto. Os negócios com estações de serviço estão na mira da PJ. Entre outros casos.
Miguel Carvalho / VISÃO nº 585 20 Mai. 2004
A Repsol, uma das dez maiores petrolíferas privadas do mundo, instalou uma bomba de gasolina na freguesia de Rio Tinto, em Gondomar, entre 1997 e 98, tendo efectuado um donativo de 100 mil euros (20 mil contos) ao Sport Clube Rio Tinto. Os responsáveis da multinacional no nosso país recusaram prestar qualquer esclarecimento à VISÃO sobre o assunto – incluindo a data de construção da bomba – escudando-se no carácter «confidencial» deste tipo de informações.
No entanto, Artur Monteiro, presidente daquele clube da III Divisão Nacional, confirmou o montante: «É verdade. A Repsol deu-nos esse dinheiro em duas tranches de 10 mil contos. Fez-nos muito jeito.» Cerca de sete anos depois da oferta, o orçamento anual do clube continua a não ultrapassar os 250 mil euros. A petrolífera, essa, não esclarece a que título entregou aquele montante. Segundo fonte autorizada da autarquia gondomarense, as negociações relativas a bombas de gasolina eram da competência de José Luís Oliveira, detido no âmbito do processo Apito Dourado. Ao que apurou a VISÃO, os negócios imobiliários e os relacionados com a instalação de postos de abastecimento de combustível em Gondomar constituem pasto para as averiguações da Polícia Judiciária (PJ), decorrentes da operação Apito Dourado. A hipótese de alguns licenciamentos poderem, alegadamente, ocultar diversos tipos de financiamento ou negócios à margem da lei está a ser averiguada pelas autoridades. A esse respeito, assumirão particular relevância para os investigadores casos como o dos licenciamentos das bombas da GALP, instaladas em São Cosme e Rio Tinto, havendo mesmo, em relação a esta última, um diferendo em tribunal.
Foi-se o posto
A história conta-se em duas penadas.
De acordo com o queixoso, Benedito Ribeiro, gerente da firma com o mesmo nome, a GALP (antiga Petrogal) concessionou-lhe, a partir de 1980, a exploração de um posto de combustível no lugar da Venda Nova, em Gondomar. Em 1996, José LuísOliveira, antigo vice-presidente da Câmara de Gondomar, terá contactado com a firma, a fim de se proceder à transferência do posto para outro local, alegando que a autarquia pretenderia proceder a um novo arranjo no espaço onde estava instalada a referida bomba. Estavam já em curso conversações com a própria GALP, no sentido de ser encontrado um novo terreno. Benedito Ribeiro efectuou algumas tentativas nesse sentido, tendo enviado à GALP um fax dando conta da existência de um terreno disponível, na freguesia de Rio Tinto. O proprietário, Viriato Castro, pedia, segundo o queixoso, 200 mil contos negociáveis. As partes dialogaram durante algum tempo sobre o assunto, nunca estando em causa a titularidade do referido posto, apesar da transferência. Ou seja, a julgar pelos documentos do processo, a que a VISÃO teve acesso, Benedito Ribeiro manteria a antiga concessão em relação à nova bomba de gasolina.
Das ameaças à prática
A GALP e a Câmara, com especial participação de José Luís Oliveira, negociaram os termos da instalação no novo local. A petrolífera cortou o abastecimento ao velho posto e o «vice» de Valentim levou à prática as diversas ameaças de encerrar a antiga bomba à força. A 1 de Agosto de 2000, consumou a desocupação e desmantelamento do posto, com polícia a vigiar as operações. O terreno de Viriato Castro, inicialmente negociável por cerca de 200 mil contos, «foi vendido por350 mil», confirmou o próprio à VISÃO. O antigo proprietário do terreno onde hoje está o posto da GALP de Rio Tinto reconhece não se dar mal com os negócios em Gondomar. A sua sobrinha, Cristina Castro, antiga vereadora da autarquia, pertence, de novo, ao executivo. Benedito Ribeiro é que ainda hoje não sabe como ficou de mãos a abanar. Sem posto velho nem bomba nova, pede uma indemnização de 18 mil contos. E em Rio Tinto existem, agora, duas bombas separadas por 400 metros: uma da GALP e outra da Repsol. Para além de estes negócios poderem constituir matéria para as averiguações policiais em curso, a PJ procura outras ramificações. Uma busca efectuada à empresa Águas de Gondomar, há algumas semanas, poderá ter colocado os investigadores na pista de um alegado caso de«luvas» relacionado com a privatização da empresa, cujo rasto poderá chegar ao PSD. Do mesmo modo, a vasta documentação recolhida em diversos gabinetes da autarquia terá levado a Judiciária a descobrir listas de funcionários camarários que receberiam o vencimento sem praticamente pôr o pé na edilidade, no caso familiares de futebolistas de clubes da terra, de dirigentes associativos, entre outros.