07 dezembro 2006

Vice de Valentim, filho e jurista foram alvo de buscas da PJ

"O major pressionou-me para assinar logo ali o documento de venda" Maria de Lurdes Cunha (Filha de Ludovina Prata, proprietária da quinta) Quinta do Ambrósio estava em Reserva Agrícola mas pouco tempo depois a construção já era autorizada Uma família a precisar de dinheiro fresco para pagar dívidas, um terreno em Reserva Agrícola Nacional (RAN), um presidente de câmara, três investidores próximos do autarca, e uma valorização em tempo recorde, seguida de venda à Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP) por quatro vezes o preço de custo. Foram estes ingredientes que levaram a Polícia Judiciária (PJ) do Porto a efectuar buscas às casas e escritórios de José Luís Oliveira, vice-presidente da Câmara de Gondomar, Jorge Loureiro, filho de Valentim, e Laureano Gonçalves, advogado, membro do Conselho Geral do Boavista FC e ex-dirigente do Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol. Em causa nesta investigação da PJ estão suspeitas de crimes de burla e branqueamento de capitais no negócio de compra e venda, entre 2000 e 2001, da chamada "Quinta do Ambrósio", em Gondomar. Um terreno propriedade de uma família que diz ter acertado o negócio directamente com Valentim Loureiro nas instalações da Câmara de Gondomar (ver texto em baixo), embora uma procuração irrevogável destinada à transmissão do imóvel tenha sido passada somente a favor de Laureano Gonçalves, a 15 de Março de 2001. Este, por sua vez, seis dias depois, prometeu vender o terreno à STCP, na altura gerida por Oliveira Marques, actual presidente da comissão executiva da Metro do Porto. A 12 de Outubro de 2001, a Comissão Regional da RAN desafecta a parcela de terreno e dá-lhe capacidade construtiva. Investidores denunciados Três anos depois desta transacção, em Dezembro de 2004 - com o processo Apito Dourado a correr a todo o vapor -, Laureano Gonçalves vai até às Finanças declarar o negócio. Pagou o imposto de Sisa e indicou ainda José Luís Oliveira e Jorge Loureiro como parceiros da transação. A compra foi efectuada por 1,072 milhões de euros e a venda à STCP fez-se por quatro milhões. Um lucro de cerca de três milhões de euros alegadamente repartido por estes três intervenientes, que teriam de pagar os correspondentes impostos. Oliveira e Loureiro-filho foram depois às Finanças pagar a parte que lhes cabia. De acordo com informações recolhidas pelo JN, durante a investigação Apito Dourado, a PJ chegou a apreender documentos que levantam dúvidas sobre as relações financeiras principalmente entre Laureano Gonçalves e José Luís Oliveira. Depois disso, o Fisco também abriu um processo de averiguações a tão tardia declaração de venda, efectuada sem escritura formal. Tal como o JN noticiou oportunamente, o vice-presidente da autarquia de Gondomar chegou a estar indiciado durante o Apito Dourado por crime de branqueamento de capitais. Em causa estava principalmente o facto de, aquando da busca da PJ à sua casa, em Abril de 2004, Oliveira ter tentado destruir documentos bancários. Posteriormente, a PJ descobriu que dias depois da detenção, familiares do vice de Valentim transferiram para terceiros avultadas quantias que estavam depositadas em contas de bancos sedeados em paraísos fiscais (off-shores). O que levantou suspeitas sobre a proveniência do dinheiro. Família diz-se lesada O JN sabe que a PJ tentou, nas buscas, apreender documentos que pudessem ajudar a compreender os contornos do negócio, bem como o destino das verbas pagas pela STCP. Em 2001, esta empresa queria construir uma estação de recolha de autocarros, mas acabou por não levar o projecto por diante, encontrando-se a "Quinta do Ambrósio" actualmente intacta. No mesmo momento em que acertou o negócio, com assinatura de um contrato e procuração irrevogável, Ludovina Prata - com 90 anos e a sofrer de doença prolongada - terá assinado também um requerimento para alterar o destino da propriedade. Da aceitação deste pedido vieram a beneficiar os três investidores. É neste contexto que surgem as razões de queixa por parte da família de Ludovina. Alegam que só venderam o terreno por aquele valor porque teriam sido convencidos de que o mesmo nunca teria capacidade construtiva. Daí, terem sido supostamente lesados em três milhões de euros. O JN tentou, ontem, sem sucesso, obter esclarecimentos por parte de Valentim Loureiro, José Luís Oliveira, Jorge Loureiro e Laureano Gonçalves. "Sinto-me ludibriada. Não tenho dúvidas que fui vítima de um negócio ruinoso para a minha família", diz Maria de Lurdes Cunha, filha da vendedora dos terrenos da Quinta do Ambrósio, em Gondomar, Ludovina Prata. A filha da proprietária já prestou declarações na PJ e recorda, ao JN, as palavras que diz terem sido proferidas por Valentim Loureiro, presidente da Câmara de Gondomar, quando, em 2000, foi feito o contrato de promessa de compra e venda dos terrenos, inicialmente por 1,5 milhões de euros "Só lhe dou este dinheiro porque não se pode construir. É uma regra de ouro", terá dito o major. Há seis anos, Maria de Lurdes Cunha vendeu, "por razões económicas", a Quinta do Ambrósio. "Quando fui à Câmara, estava convencida que era apenas para conversar sobre a hipótese de venda. Mas fui logo confrontada com as plantas topográficas dos terrenos e, logo a seguir, foi acertado o preço. Foi tudo muito rápido. Até disse para os meus botões esta câmara funciona muito bem! Não sabia da confusão em que estava a ser metida". Acertado o preço a pagar "pela Câmara", Lurdes Cunha ainda chegou a "estranhar a pressa" na concretização do negócio e esclareceu, junto de Valentim, que a dona dos terrenos era a sua mãe, doente, e que só ela podia assinar documentos. Foi o que aconteceu mais tarde. "O major pressionou-me a assinar logo ali um documento de venda. Foi tudo feito em catadupa", diz. Lurdes alega ter perdido o controlo do negócio e não ter ficado com o documento de venda: "Fui informada que tinha sido aberta uma conta-corrente no BPN, em nome da minha mãe. E que a venda dos terrenos estava ligada ao Apito Dourado. Mais preocupada fiquei quando confirmei a venda dos terrenos à STCP por quatro milhões de euros". Manuel Vitorino, e Nuno Miguel Maia In JN de 7 de Dezembro de 2006